sábado, 9 de agosto de 2014

Abandono de tratamento

Há algum prazo mínimo para considerarmos que o paciente abandonou o tratamento? 



Qual seria o prazo mínimo que se deve estabelecer ao comparecimento do paciente às consultas de pós-operatório, antes que fique configurado abandono de tratamento – e consequente desobrigação do médico em prestar assistência. 

Estabelecer-se um prazo nos parece ideia absurda: é claro que no caso de cirurgião, este deixará de ter responsabilidade sobre paciente que abandona o pós-operatório – até por impossibilidade lógica de manter a atenção médica.

Os cenários da prática médica, em geral, e do relacionamento médico-paciente, em particular, mudaram de forma extraordinária nos últimos cinqüenta anos, por diversos fatores que trouxeram um enorme impacto no relacionamento entre o profissional da saúde e o paciente. 

Vários autores concordam que um deles foi a incorporação do conceito da Autonomia à prática médica, direito humano mencionado por vários filósofos como John Locke, Baruch Espinosa e Imannuel Kant. Em suma é reconhecido que toda pessoa tem o direito inalienável de fazer suas escolhas pessoais em relação à sua vida, suas crenças e seu relacionamento social.

Apesar dessas transformações, a relação médico-paciente continua baseada na confiança, havendo um contrato informal tácito, onde o médico se obriga a utilizar todos os meios ao seu alcance para cumprir sua missão de assistir ao paciente, e este, de colaborar ativamente para o sucesso da atenção médica, conforme seus próprios valores. 

Feitas essa observações, entendemos tanto o médico quanto o paciente têm seus valores e suas autonomias, que devem ser respeitados. 

Ao médico cabe o dever de utilizar todos os meios referentes à perícia, prudência e técnica para chegar aos seus objetivos. Ao paciente, colaborar, no sentido de preservar sua própria saúde. 

Mas fica a pergunta: com base na respectiva autonomia, o paciente tem o direito de abandonar ao tratamento e/ou de não seguir as recomendações no pós-operatório? Sim, claro que tem. Mas tal decisão deve ser escrita no prontuário, com todos os detalhes. 

Ao manter um relacionamento respeitoso e educado com atendidos e seus familiares, e ao cumprir todos os deveres acima elencados o médico dificilmente será vitima de qualquer manobra aética por parte de seu paciente. 

(Parecer Consulta nº 155.608/11, do Cremesp http://migre.me/ka0wt )
(Centro de Estudos Bioéticos do Cremesp)

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