sábado, 13 de dezembro de 2014

O que é a Bioética?



O início da Bioética se deu no começo da década de 1970, com a publicação de duas obras muito importantes de um pesquisador e professor norte-americano da área de oncologia, Van Rensselaer Potter.

Van Potter estava preocupado com a dimensão que os avanços da ciência, principalmente no âmbito da biotecnologia, estavam adquirindo. Assim, propôs um novo ramo do conhecimento que ajudasse as pessoas a pensar nas possíveis implicações (positivas ou negativas) dos avanços da ciência sobre a vida (humana ou, de maneira mais ampla, de todos os seres vivos). Ele sugeriu que se estabelecesse uma “ponte” entre duas culturas, a científica e a humanística, guiado pela seguinte frase: “Nem tudo que é cientificamente possível é eticamente aceitável”.

Um dos conceitos que definem Bioética (“ética da vida”) é que esta é a ciência “que tem como objetivo indicar os limites e as finalidades da intervenção do homem sobre a vida, identificar os valores de referência racionalmente proponíveis, denunciar os riscos das possíveis aplicações” .

A bioética, como área de pesquisa, necessita ser estudada por meio de um olhar interdisciplinar. Isso significa que profissionais de diversas áreas (profissionais da educação, do direito, da sociologia, da economia, da teologia, da psicologia, da medicina etc.) devem participar das discussões sobre os temas que envolvem o impacto da tecnologia sobre a vida. Todos terão alguma contribuição a oferecer para o estudo dos diversos temas de Bioética. Por exemplo, se um economista do governo propõe um novo plano econômico que afeta (negativamente) a vida das pessoas, haverá aspectos bioéticos a serem considerados.

O progresso científico não é um mal, mas a “verdade científica” NÃO pode substituir a ética.

(Unifesp)

Operação plástica possui obrigação de meio ou de fim?



Como em toda a prática médica, o objetivo do ato médico na Cirurgia Plástica constitui obrigação de meio e não de fim ou resultado, esclarece o artigo 4º da Resolução CFM nº 1.621/01.

O tratamento pela especialidade visa trazer benefício à saúde do paciente, seja físico, psicológico ou social, enfim, melhoria sobre sua qualidade de vida, já que busca tratar doenças e deformidades anatômicas, congênitas, adquiridas, traumáticas, degenerativas e oncológicas, bem como de suas conseqüências.

Porém, considerando-se que a diversidade de resposta biológica é inerente às características individuais e genéricas das pessoas, não se pode prometer resultados ou garantir o sucesso do tratamento, devendo o médico informar ao paciente, de forma clara, os benefícios e riscos dos procedimentos, como em qualquer especialidade médica.

Os médicos que atuam nesta área têm sua prática profissional regulamentada pelo Conselho Federal de Medicina, registrando o título de especialista obtido pela Residência Médica credenciada pela Comissão Nacional de Residência Médica ou em prova específica da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.

Da mesma forma que os demais colegas de profissão, o cirurgião plástico deve manter em sua prática conduta ética e não utilizar procedimentos experimentais – a não ser em circunstâncias especificamente consideradas como pesquisa clínica, sempre com prévia autorização do paciente e utilizando as normas da Convenção de Helsinque, e do Conselho Nacional de Saúde.

(Centro de Bioética do Cremesp)
(Resolução nº 1.621/01 do CFM http://migre.me/kwBpT)
(Resolução nº 81/97 do Cremesp http://migre.me/kwBsA)

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Morte presumida

E o fim da vida no direito brasileiro



Saiu no Jornal Folha de S. Paulo no dia 9/1/11:

“Autoridades argentinas e familiares do alpinista brasileiro Bernardo Collares, 46, decidiram ontem, após reunião com uma comissão de resgate, deixá-lo no topo do monte Fitz Roy, de 3.405 metros de altitude.

Especialistas acreditam que não há chances de Collares ter sobrevivido ao acidente que sofreu na última segunda-feira em El Chaltén, extremo sul argentino.

Um dos irmãos, Leandro Collares, 36, disse que ‘a palavra oficial da família é a de que ele [o alpinista] está morto’. Embora durante o dia ele tenha afirmado que era contra a suspensão das buscas, à noite preferiu não se manifestar sobre isso”.

Já vimos aqui (http://migre.me/kvV9e) quando é que a vida começa para o direito brasileiro. Mas quando é que ela termina?

A resposta óbvia é que ela termina com a morte. Mas, às vezes, é impossível apurar exatamente quando é que a pessoa morreu, e mesmo se ela morreu.

Pense no caso da matéria acima. Alpinistas e médicos presumem que já esteja morta. Mesmo que presumamos que já esteja morte, a última vez que a pessoa foi vista ela estava viva. Desde então ninguém sabe o que aconteceu com ela. Qualquer pessoa que já tenha visto um certidão de óbito vai reparar que ela contem não só o local e a causa da morte, mas o dia e a hora da morte.

O dia e hora da morte são importantes. Isso porque é a partir desse momento que nasce o direito dos herdeiros e legatário de sucederem o morto, e cessam os direitos e obrigações do morto. Por exemplo, imagine, no caso da certidão acima, que a única filha da pessoa morta fosse casada e não tivesse filhos e que a mãe fosse viúva. Vamos também imaginar que essa filha tenha morrido uma hora antes da mãe (às 21h). Nesse caso, como a filha morreu antes da mãe, ela não terá direito à herança deixada pela mãe. Nesse exemplo, o marido da filha (ou genro da pessoa referida na certidão acima) não terá direito aos bens que um dia pertenceram à sua sogra, pois o genro não herda da sogra (exceto se ela deixou os bens em testamento para ele). Mas se a filha morreu uma hora depois da mãe (às 23h), a filha terá herdado os bens da mãe e, uma hora depois, deixado aqueles mesmos bens para seus próprios herdeiros. Nesse caso, o genro tem direito aos bens não porque fosse genro (como vimos, genro não herda), mas porque ele é herdeiro de sua esposa, que herdou os bens da mãe às 22h e morreu logo em seguida, deixando os mesmos bens para o seu herdeiro (no caso, o esposo).

Pois bem, voltemos ao caso da matéria acima. Como vimos, ninguém sabe exatamente quando o alpinista morreu (ou mesmo se morreu). Mas a lei não pode permitir que a sociedade viva em dúvida (uma das funções das leis é justamente evitar incertezas na sociedade).

Por isso nosso Código Civil autoriza (em seu artigo 7º) que, mesmo quando não há certeza, declare-se a morte de alguém. É a chamada morte presumida. É o caso, por exemplo, do soldado que vai para a guerra e desaparece, ou do velejador cujo barco afunda no meio de uma tempestade, ou do passageiro do avião que cai no mar. Em nenhum desses casos dá para termos certeza que a pessoa morreu, e muito menos sobre qual foi a causa da morte, mas as circunstâncias levam a crer que ela deva estar morta.

Por isso a lei diz que “se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida”, o juiz poderá, em uma sentença, declarar que a pessoa está morta e fixar a data da morte. É óbvio que ninguém saberá se aquela data fixada pelo magistrado realmente foi a data na qual a morte ocorreu, mas a lei tratará o caso como se a morte tivesse ocorrido na data declarada na sentença. Isso é o que chamamos de morte presumida.

A declaração de morte presumida, contudo, só pode ser pedida depois “de esgotadas as buscas e averiguações”, segundo a mesma lei. É por isso que sempre ouvimos na TV as autoridades dizendo que estão encerrando as buscas (lembram-se, por exemplo, do caso do avião que caiu no Atlântico que vimos aqui?). Essa declaração de encerramento de buscas é muito importante pois normalmente é a partir desse momento que os interessados podem pedir a declaração da morte presumida.

Por fim, reparem que no último parágrafo da matéria um irmão da vítima diz que a palavra ‘oficial da família é que ele está morto’. A opinião da família não interessa para a lei. Do ponto de vista jurídico, o que interessa é a opinião das autoridades e especialistas (no caso, dos médicos). Ainda que a família discorde da opinião das autoridades (por exemplo, se ela continuar procurando o velejador desaparecido depois de encerradas as buscas oficiais ou desistir de procurá-lo antes que as autoridades encerrem as buscas), o juiz se informará baseado nas opiniões das autoridades e especialistas, pois a família não necessariamente tem o conhecimento técnico necessário.

(Coluna Para entender direito, da Folha de S. Paulo)

Que critérios adotar quando há dois pacientes em situação de emergência e apenas um equipamento de “ressuscitação”?



Trata-se de situação complexa em que, qualquer que tenha sido a decisão do médico, esta poderá sempre ser questionada.

Os princípios de Beneficência, Não-Maleficência e Autonomia pouco servirão, uma vez que, supõe-se, o médico desejará beneficiar e não prejudicar a todos, respeitando também a autonomia de todos.

Nesta hora poderá ser de valia, no entanto, o princípio de Justiça: é o que fala da obediência, por parte do profissional, aos usos e costumes (moral) da comunidade, ou à legislação e sua jurisprudência, na sociedade. Obediência essa que poderá até mesmo afrontar os juízos de valores próprios do profissional.

Com base na Justiça, o critério de se priorizar o doente que se achar em situação mais crítica (risco maior de morte) é o que deverá prevalecer. Pode-se considerar que, para o menos grave, poderá existir ainda outra oportunidade.

Entretanto, a autonomia poderá ser levada em conta quando houver manifestação clara do doente (ou de sua família), no sentido de querer (ou não) ser atendido.

A expectativa de maior qualidade – e quantidade – de vida é outro critério, o qual colocaríamos hierarquicamente após os anteriores. Exemplificando (e radicalizando), um paciente oncológico, em fase terminal, ou um idoso, em idêntico estado, serão despriorizados no atendimento se o outro for um jovem, traumatizado de crânio, vítima de acidente.

Outros critérios, como os prevalecentes em alguns estados dos EUA, como o de se dar preferência a quem não se expôs voluntariamente a riscos (como no caso do uso de cinto de segurança, não ingestão de álcool, realização de exames periódicos para prevenção de episódios agudos de doenças etc), podem até ser considerados, mas afrontam nossa postura ética (antes de tudo, pessoal).

O que não dizer daqueles que, em uma Unidade de Pronto Atendimento, sentindo-se justiceiros, não hesitariam em sentenciar: "entre o policial e o bandido, em igualdade de condições, é claro que eu atendo antes o policial!"?

(Parecer 34.869/00, do Cremesp http://migre.me/ktF0E)

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Podemos internar viciados em drogas à força?



Saiu no Jornal Folha de S. Paulo no dia 25/1/12:

“90% aprovam internação involuntária

É quase uma unanimidade: 9 em cada 10 brasileiros acham que os viciados em crack devem ser internados para tratamento mesmo que não queiram (…)

A chamada internação involuntária (feita à revelia do paciente/viciado) é prevista na lei 10.216, de 2001, que trata de doentes mentais (…)

O psiquiatra Marcelo Ribeiro, professor na Unifesp e um dos organizadores do livro "O Tratamento do Usuário do Crack", diz que a internação involuntária deve ser considerada para os que estão numa fase aguda do vício, quando o drogado perde a capacidade de escolher se deixa ou não o consumo do crack, e é o primeiro passo para que o viciado recupere a condição de analisar a própria vida (…)

Já o Conselho Federal de Psicologia é contra. O presidente do órgão, Humberto Verona, diz que a internação involuntária não pode ser vista como sinônimo de tratamento (…)

Outro argumento dos que discordam da internação sem o consentimento dos doentes é que os direitos deles estariam sendo violados.”

Pra começar, precisamos diferenciar internação compulsória da internação involuntária:

I - Internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário;

II - Internação involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiro; e

III - Internação compulsória: aquela determinada pela Justiça.

Esse é um assunto interessante do ponto de vista jurídico porque o Brasil – como outras democracias – ainda não conseguiu encontrar uma solução racional, seja para justificar a internação, seja para justificar a não internação.

O artigo 5º da Constituição diz que todos somos livres e que temos direito (e não obrigação) à vida. Essa liberdade inclui o direito de fazermos com nossas vidas o que quisermos. Se eu quiser viver na miséria, viver na rua ou me matar, eu posso. A lei não pode me obrigar a trabalhar, a viver em uma casa ou me punir se eu tentar me matar.

Por outro lado, a lei não pode me garantir o contrário: ela não pode me garantir que eu serei bem sucedido, que eu viverei em uma mansão ou que eu não morrerei ao sair de casa hoje. O que ela garante é que, se eu precisar e quiser tratamento médico, haverá (ou deveria haver) um hospital para me ajudar; se eu precisar e quiser um abrigo, haverá (ou deveria haver) um albergue público para me acolher. Se alguém ameaça minha vida, posso recorrer à polícia para me proteger.

Ou seja, a lei garante um mínimo de proteção se eu precisar e quiser utiliza-la, e garante que se eu não quiser utilizar tal ‘rede de proteção’, eu não serei obrigado a faze-lo.

Por conta disso, se eu quiser me matar tomando algum medicamento ou me tornar incapacitado, posso. Não deveria (regra moral), mas posso (regra legal).

Mas nossas leis adotam um princípio básico de que algumas pessoas não sabem o que estão fazendo e, por isso, devem ser protegidas de forma especial. E um dos mecanismos de proteção é retirar delas o direito de decidir o que fazer com suas vidas.

Uma criança órfã que herde uma fortuna enorme não pode gerenciar seu dinheiro enquanto não atingir a capacidade civil (18 anos; ou após os 16 anos, se for emancipada). Se ela pudesse, gastaria tudo em jujubas e picolés. Isso não é uma punição contra ela, mas uma forma de protege-la. O mesmo ocorre se uma criança precisar de tratamento médico. Se dependesse dela, ela jamais tomaria a injeção ou faria a cirurgia. Mas a injeção ou cirurgia são essenciais para protege-la, ainda que ela não saiba disso. É por isso que a lei deixa nas mãos dos pais (ou mesmo da Justiça) decidir por ela. Novamente, isso não é uma punição, mas um mecanismo de proteção. Quando ela se tornar adulta e souber o que está fazendo, ela poderá recusar tratamento médico, mesmo que isso signifique que ela irá morrer (pense nos grupos religiosos que recusam a transfusão de sangue, por exemplo). E poderá gastar sua herança em jujubas e picolés, se ainda quiser. Em outras palavras, as pessoas capazes é que não são obrigadas a utilizar a rede de segurança garantida pela lei. As incapazes são obrigadas a utilizar tal rede até se tornarem capazes.

Bem, a lei diz que não são apenas os menores que são incapazes. Os deficientes mentais, por exemplo, também são incapazes, na medida de sua deficiência.

E ela também não trata a incapacidade como algo único. Ela estabelece graus de incapacidade: aqueles que são absolutamente incapazes e aqueles que são apenas relativamente incapazes. Por exemplo, alguém entre 16 e 18 anos é relativamente incapaz, enquanto alguém mais novo será absolutamente incapaz.

No grupo dos relativamente incapazes, a lei inclui “os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido” (art 4º do Código Civil). Em outras palavras, os alcoólatras e viciados em drogas são relativamente incapazes.

E é isso que complica a decisão sobre como trata-los. Se fossem absolutamente incapazes, a solução seria fácil: não sabem o que estão fazendo e por isso devem ser internados para sua própria proteção. Mas o relativamente incapaz sabe o que está fazendo, ao menos até certo ponto. É por isso que ele pode tomar decisões que afetam sua vida, desde que assistido por outra pessoa que vele por seus interesses. Essa segunda pessoa (o responsável legal, como os pais ou tutores) está lá para auxiliar e preencher o vácuo deixado pelo que ainda lhe falta para atingir uma capacidade plena.

E aí aparecem três problemas jurídicos e práticos que continuam sem solução no país:

Quão capazes eles são para decidir se precisam e/ou devem ser internados? Eles estão mais para um adulto ou mais para uma criança? Em alguns momentos eles estão totalmente lúcidos, e em outros, não. Como chegar a uma regra aplicável na prática e justificável racionalmente? A lei não tem uma solução prática e genérica.

É possível tratar usuários diferentes, drogas diferentes, e formas de uso diferentes da mesma forma? Alguém que usa a droga duas vezes por dia deve ser tratado da mesma forma que alguém que a usa três vezes por dia e alguém que a usa cinco vezes por dia, mas apenas uma vez por semana? E alguém que usa um pouco de crack deve ser tratado da mesma forma que alguém que muita maconha? E o que é 'um pouco' de crack? É possível achar uma regra geral? Sem uma regra geral (ou regras específicas que sejam práticas), é difícil elaborar uma lei útil, e dezenas de milhares de casos irão parar na Justiça e terão de ser decididos um a um, o que vai causar mais problemas do que resolver.

Finalmente, vale a pena forçar alguém que não quer se tratar, ser internado? A lei não existe em um vácuo. Ela existe para organizar a nossa realidade. As boas leis são aquelas que resolvem problemas reais. As leis ruins são aquelas que criam mais problemas. Pode ser uma perda de tempo gastar recursos públicos para tratar alguém que não quer se tratar. Ou pode não ser. Se a decisão de não ser internada é racional, as chances sucesso do tratamento são bem menores porque é uma opção de vida da pessoa ser viciada (como no caso do adulto que resolveu recusar tratamento médico). Mas se ela não sabe, a internação forçada pode ser uma forma efetiva de tratar (como no caso da criança que não pode recusar tratamento médico). Mas como ela é incapaz, e como seres humanos não vêm com lâmpadas na testa mostrando se são/estão racionais ou não, a lei ainda não encontrou uma forma prática de saber qual o melhor caminho a tomar.

(Coluna Para entender direito, da Folha de S. paulo)

Fere a ética fornecer amostras-grátis?



A prática de fornecimento de amostras-grátis é corriqueira e se constitui em manobra utilizada pelos laboratórios farmacêuticos, visando divulgar seus produtos, apresentando-os à classe médica a fim de demonstração ou mesmo para evocar a sua lembrança.

Novos lançamentos e medicamentos aos quais se queira alavancar as vendas são gratuitamente fornecidos aos médicos.

Segundo parecer do Cremesp, "nessa rotina, o médico não aufere nenhum benefício financeiro – simplesmente recebe sem ônus os medicamentos e, conhecedor dos problemas e situação financeira de seus pacientes, procura, de alguma forma, minorar estas dificuldades, fornecendo os remédios. O médico não comete deslize ético tendo tal atitude, quer atue em consultório privado, quer atue em UBS. Pelo contrário: atende ao Art. 2º do Código de Ética Médica, que diz: 'o alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional'."

A resolução RDC 60 da Anvisa trouxe novas exigências para a distribuição de amostras grátis.

Para evitar um tratamento incompleto, no caso dos antibióticos, os profissionais deverão entregar ao paciente a quantidade suficiente para o tratamento. Amostras de anticoncepcionais devem ser entregues 100%, ou seja, com o mesmo número de pílulas do medicamento original. E a partir e agora, é norma a expressão "venda proibida", antes apenas uma recomendação. Os médicos, dentistas e veterinários passam a ser responsáveis pela conservação e pela validade do estoque de amostras mantido no consultório.

(Centro de Bioética do Cremesp)
(Parecer 57.662/99, do Cremesp http://migre.me/kn62S)
(RDC 60, de 12/12/2012, da Anvisa)

Protestar sem roupa pode levar à prisão por atentado violento ao pudor?



Não. Apesar de comumente notícias relacionadas a grupos como o Femen, onde mulheres protestam com seios à mostra, mostrarem prisões em flagrante por atentado [violento] ao pudor, é impossível, nos dias de hoje, alguém ser preso por isso. Isso porque esse crime deixou de existir em 2009.

Existe uma grande confusão entre os termos "Atentado violento ao pudor" e "Ato obsceno".

O Atentado violento ao pudor consistia em qualquer forma de sexo feito sob violência ou grave ameaça, exceto introdução do pênis na vagina (o que era estupro). Desde a nova lei publicada em 2009, os dois crimes (atentado violento ao pudor e estupro) foram incorporados em apenas um: estupro (a pena máxima é de 10 anos).

O crime pelo qual as integrantes do Femen podem ser presas é chamado ato obsceno, que significa praticar um ato obsceno em lugar público ou exposto ao público (a pena máxima é de 1 ano).

Ato obsceno é aquele que fere a moralidade pública. No caso, mostrar os seios no meio da rua. Note que obscenidade é uma avaliação subjetiva e vai depender da cabeça do magistrado. Para muitos, as mulheres devem ter o mesmo direito de mostrar seus peitos que um homem. Ninguém prende um homem andando sem camisa pela rua (aliás, recentemente nos EUA a Justiça decidiu que tirar toda a roupa para protestar não é ato obsceno, mas o exercício da liberdade de expressão).

(Coluna Para entender direito, da Folha de S. Paulo)
(Boletim do STJ)

Anvisa



A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é uma agência reguladora, que tem como área de atuação todos os setores relacionados a produtos (nacionais ou importados) e serviços que possam afetar a saúde da população brasileira.

Criada pela Lei nº 9.782, de 26 de janeiro 1999, ela é uma autarquia. Isso significa que embora ligada ao governo (no caso, ligada ao Ministério da Saúde) ela possui uma determinada autonomia em relação ao resto do governo. O grau de autonomia varia de acordo com a autarquia (elas são estabelecidas em leis específicas).

No caso da Anvisa, a autonomia existe por conta de três fatores: a independência de seus diretores, o Contrato de Gestão e a autonomia financeira.

Diretores

Seus 5 diretores são nomeados para mandatos de 3 anos, e podem ser reconduzidos por um igual período. Depois de empossados, esses diretores podem ser removidos nos 4 primeiros meses do mandato. Mas, depois disso, eles se tornam 'estáveis' até o fim do mandato, o que significa que só podem ser removidos se praticarem improbidade administrativa, forem condenados penalmente (sem possibilidade de recurso), ou se deixarem de cumprir o Contrato de Gestão que a Agência mantêm com o Ministério da Saúde.

Por causa dessa garantia, ainda que eles tenham chegado ao cargo por suas conexões políticas, eles ficam menos sujeitos às pressões políticas vindas do resto do governo.

Esse "escudo" também existe em outras funções delicadas dentro do governo, como o mandato de 2 anos do procurador-geral da República.

Contrato de gestão

O contrato entre a Agência e o Ministério – chamado de 'contrato de gestão' – é a alma da Anvisa.

Quando o diretor-presidente da Anvisa (um dos 5 diretores, nomeado pelo presidente da República para mandato de 3 anos) toma posse, ele tem 120 dias para negociar um contrato com o Ministério da Saúde. É esse contrato que vai determinar que a Anvisa precisa alcançar determinadas metas. As metas em si são pactuadas em um Plano de Trabalho anual e são bem específicas. Estabelecem valores e percentuais de eficiência. Coisas como "implantar a gestão do risco sanitário de portos, aeroportos e fronteiras em 80% dos postos de vigilância sanitária da Anvisa, em 2011", e como esses 80% serão calculados: "Número de postos de vigilância sanitária de PAF com percentual de risco identificado x 100 / Número de postos de vigilância sanitária de PAF".

Se a Anvisa descumpre o que foi contratado, ela precisa encaminhar uma justificativa ao Ministério da Saúde em 60 dias. Se ela não fizer isso, ou se o Ministério da Saúde não considerar a justificativa procedente, ele pode encaminhar o pedido de exoneração dos diretores da Anvisa ao presidente da República.

Esses indicadores e metas são negociados anualmente e todos os anos a Anvisa precisa dizer que metas deixou de alcançar.

Autonomia financeira

Por fim, a autonomia financeira significa que o orçamento da Anvisa é separado do resto do orçamento do Ministério da Saúde (a bem da verdade, a Anvisa recebe de duas fontes no orçamento anual: uma em seu próprio nome e também o Fundo Nacional de Saúde) e a utilização desses montantes, desde que respeitadas as regras orçamentárias, fica a critério da autarquia.

(Lei 9.782/99 http://migre.me/kkN5o)
(Coluna Para entender direito, da Folha de S.Paulo)

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Assistir vídeo com pornografia infantil na internet é crime?



Saiu no Zero Hora no dia 29/07/10:

“A Delegacia de Repressão aos Crimes Informáticos busca identificar mais de 10 mil internautas que fizeram download de vídeo em que dois adolescentes de Porto Alegre aparecem em cenas íntimas. O delegado Emerson Wendt pediu à administração do site ‘4shared’ informações sobre quem postou o vídeo na página de compartilhamento de arquivos.

— O objetivo é identificar principalmente quem colocou o vídeo no ar. Depois, queremos saber quem baixou as imagens. O armazenamento de conteúdo impróprio é enquadrado no artigo 241-B do Estatuto da Criança e do Adolescente — explica Wendt.

A legislação determina que a pessoa que adquirir, possuir e armazenar foto, vídeo ou outro tipo de registro de cenas que envolvam sexo entre adolescentes, está sujeita a uma penalidade de um a quatro anos de prisão mais multa.”

O artigo 241-B do ECA fala que é crime:

“Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar (…) vídeo (…) que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente” (art. 241-A)

“Adquirir, possuir ou armazenar (…) vídeo (…) que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente” (art. 241-B)

E quem assistiu o vídeo?

Reparem que a lei não usa o verbo assistir e por isso existe a dúvida sobre o que pode acontecer com as 10 mil pessoas que assistiram o vídeo. 

O que a lei fala é que eles não podem oferecer, divulgar (por exemplo, colocado um link para onde o vídeo estava armazenado, ou mandado um e-mail para um amigo avisando que o vídeo existe, ou indicado o site para os amigos na mesa do bar), armazenar (no HD do PC, pen drives ou em serviços de armazenamento em nuvem como o Google Drive ou OneDrive), distribuir (por bluetooth entre celulares ou mesmo por redes como o WhatsApp) ou transmitir o vídeo.

Como vimos, a lei diz que é crime ter armazenado o vídeo. Ou seja, quem faz o download do vídeo para seu computador, e o armazena terá cometido o crime. 

A lei diz que é crime adquirir e possuir o vídeo, e aí o problema é bem maior, pois esses dois termos são subjetivos quando estamos falando de internet. Adquirir é ter direito ao acesso ou passar a ser dono. Possuir é estar de posse, ou seja, ter consigo ou ter o direito de usar, ainda que não seja o dono (proprietário). Aqui há um espaço enorme para debates pois quem acessou o site onde o vídeo estava armazenado, a princípio, não estava de posse nem adquiriu o vídeo, mas dependendo da tecnologia usada para assistir o vídeo, o computador do usuário pode ter armazenado o vídeo ainda que apenas temporariamente (por exemplo, os vídeos podem ter sido carregados na memória volátil/temporária do computador). Nesse caso, é possível alegar que quem assistiu cometeu o crime.

E quem assistiu sem querer? 

Primeiro, como a lei não diz que esses crimes são punidos também em sua modalidade culposa, quem assistiu o vídeo sem querer não pode ser punido, pois um crime só é punido na modalidade culposa (cometido sem querer) quando a lei é clara a esse respeito. Mas, um bom magistrado, pode fazer um segundo teste para determinar a intenção do internauta: por quanto tempo a pessoa assistiu. A pessoa pode ter assistido por alguns poucos segundos e assim que percebeu do que se tratava parou de assistir. Fica claro para o magistrado que ela não tinha a intenção de assistir. Mas se ela, ainda que a princípio não soubesse do que se tratava o vídeo, começou a assistir e continuou assistindo, ela pode até não ter tido a intenção de assistir um vídeo com pornografia infantil quando acessou a página, mas ela tampouco parou de assistir depois que ela descobriu do que se tratava. Nesse caso, ela teve a vontade (dolo) de continuar a cometer o crime. É o mesmo que alguém que não tinha a intenção de atropelar um pedestre mas, depois de tê-lo atropelado, dá marcha ré para atropelá-lo novamente.

(Coluna Para entender Direito, Folha de S. Paulo)

Gripe espanhola

A mais assassina de todas as pandemias



Em 1918, o planeta estava passando pelo conflito mais devastador da história: a 1ª Guerra Mundial. Mas as mortes no front viraram fichinha diante do estrago causado pela gripe espanhola, que avançou pelo mundo simultaneamente. As estimativas variam, mas ela provavelmente matou, em poucos meses, cerca de 50 milhões de pessoas. Até hoje, nenhuma epidemia global conseguiu superar esse macabro recorde.

Com as técnicas modernas de biologia molecular, cientistas do século 21 foram capazes até de recriar o vírus causador da gripe em laboratório. Isso, entretanto, não impede que mistérios continuem rondando a doença, a começar por sua origem geográfica. "Os locais mais prováveis são o interior dos EUA e a Europa Ocidental", diz o biólogo Atila Iamarino, que estuda evolução viral em seu doutorado na USP. "Mas muitos fatores atrapalham essas análises. Várias cidades distantes umas das outras nos EUA, por exemplo, relataram as primeiras mortes num intervalo muito curto de tempo, o que indica que o vírus já circulava antes." Para dificultar ainda mais o trabalho dos pesquisadores, os países que estavam em guerra tendiam a ocultar seus casos, porque isso revelaria que muitos soldados estavam fora de combate. "A gripe só recebeu o nome de espanhola porque a Espanha, neutra no conflito, expôs seus casos."

De qualquer maneira, a velocidade com que a doença se espalhou e a intensidade dos sintomas sugerem que o vírus - que era do tipo H1N1, tal como o da gripe suína - resultou de uma transformação nas formas de gripe que existiam antes, e provavelmente também de uma mistura com vírus que circulavam em animais, como aves e porcos. O problema é saber que alteração foi essa. "As amostras de vírus da época são poucas, e não temos dados sobre as formas virais que existiam em porcos, por exemplo", diz Iamarino.

Hoje, existem 3 hipóteses principais sobre o tema: a primeira sugere que o vírus "espanhol" veio diretamente de aves para humanos; a segunda aposta numa mistura entre vírus suínos e aviários; e a terceira fala em um vírus "mestiço" de gripes humanas e suínas. Para o biólogo da USP, a ideia de que o vírus já tinha se adaptado ao organismo de mamíferos como nós faz sentido, porque as gripes de origem aviária normalmente não são transmitidas facilmente de pessoa para pessoa.

Seja como for, a relativa novidade do vírus fez com que o sistema de defesa do organismo das vítimas não estivesse preparado para ele, o que tanto facilitou a disseminação da doença quanto a tornou mais letal. Diferentemente do que acontece em outras gripes (com exceção da atual onda de gripe suína, que é parecida com a espanhola nesse aspecto), adultos jovens e saudáveis foram mais afetados - e mortos - pela pandemia de 1918. Há várias hipóteses para esse fenômeno. Uma das possibilidades é que, justamente por serem saudáveis, essas pessoas tiveram uma reação de defesa descontrolada diante do vírus, o que acabou causando mais mal do que bem a seu organismo. Além disso, as próprias condições da guerra facilitavam a concentração de muitos indivíduos de boa saúde e na flor da idade - ou seja, soldados - no mesmo lugar, o que certamente acabou virando um prato cheio para a transmissão do vírus assassino. 

Prontuário:

Quando ocorreu - 1918-1919
Vírus causador - H1N1
Origem da epidemia - Desconhecida
Total de óbitos* - 50 milhões
Mortalidade* - 5% dos infectados

* Número estimado.

(Reinaldo José Lopes, para Superinteressante)

domingo, 10 de agosto de 2014

A imprensa e o suicídio



De todos os casos de saúde pública no Brasil, o suicídio é certamente aquele que menos espaço ocupa na mídia. Fala-se muito pouco sobre o assunto, e quase sempre com reservas.

Não existe nenhuma norma que proíba a imprensa de noticiar casos de suicídio. O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, por exemplo, mesmo vedando a veiculação de informações de caráter pessoal, mórbido e sensacionalista, além de outros, ainda não trata diretamente da questão.

Mas em grande parte das redações, é recomendado aos jornalistas que evitem ao máximo a divulgação de suicídios. A justificativa para esse procedimento se baseia na hipótese de que qualquer notícia sobre suicídio pode precipitar a ocorrência de novos casos, por imitação ou mimetismo - processo através do qual a notícia serve de inspiração para a repetição do ato. 

Entre as normas editoriais do grupo RBS, por exemplo, consta o seguinte tópico: "As notícias sobre suicídios - a não ser em casos excepcionais - não devem ser divulgadas ou destacadas. (É fato comprovado que a divulgação de suicídios estimula a morte de suicidas potenciais)". O manual das Organizações Globo também faz referência ao tema: "Em princípio, não se deve divulgar casos ou tentativas de suicídio. Qualquer possibilidade de exceção deve ser cuidadosamente avaliada pela direção de jornalismo da emissora".

(Vanessa Canciam, para Observatório da Imprensa)

Uso de cadáveres nas aulas práticas de Anatomia



Na legislação brasileira, existem três formas de doação de cadáveres para as instituições de ensino: a doação em vida (através de documentação registrada em cartório), a doação pela família e a doação de cadáveres não reclamados no prazo de 30 dias (cadáveres geralmente de indigentes e pacientes psiquiátricos, lotados nos departamentos médicos legais e que são sujeitos que não expressaram sua vontade de doação). 

"O cadáver não reclamado junto às autoridades públicas no prazo de trinta dias poderá ser utilizado pelas escolas de Medicina" (artigo 2° da lei 8501/92). 

A grande necessidade de cadáveres, especialmente para as instituições de ensino superior, acaba gerando problemas como a escassa disponibilidade de corpos, uma vez que a maioria das famílias deseja enterrar seu ente por questões de ordem religiosa ou mesmo por considerar indigno o não sepultamento. Devido à escassez, afloraram contravenções do tipo roubo de cadáveres, existindo relatos muito antigos neste sentido. 

No século XIX, pessoas chegavam a ser enterradas em túmulos de ferro, com caixões duplos ou triplos, blindados com concreto ou repletos de travas para evitar o roubo. Em 1828, os ingleses Burke e Hare foram acuados de assassinar pelo menos 15 pessoas para vendê-las a um anatomista. 

Nesse contexto de necessidade de utilização de cadáveres com fins educativos e de avanço científico e de escassez dos mesmos, afloram conflitos éticos, morais, sociais e legais. 

(Lauro M. E. Dornelles, Reflexões éticas sobre questão da necessidade x escassez de cadáveres no ensino e na pesquisa, PUCRS)

sábado, 9 de agosto de 2014

Abandono de tratamento

Há algum prazo mínimo para considerarmos que o paciente abandonou o tratamento? 



Qual seria o prazo mínimo que se deve estabelecer ao comparecimento do paciente às consultas de pós-operatório, antes que fique configurado abandono de tratamento – e consequente desobrigação do médico em prestar assistência. 

Estabelecer-se um prazo nos parece ideia absurda: é claro que no caso de cirurgião, este deixará de ter responsabilidade sobre paciente que abandona o pós-operatório – até por impossibilidade lógica de manter a atenção médica.

Os cenários da prática médica, em geral, e do relacionamento médico-paciente, em particular, mudaram de forma extraordinária nos últimos cinqüenta anos, por diversos fatores que trouxeram um enorme impacto no relacionamento entre o profissional da saúde e o paciente. 

Vários autores concordam que um deles foi a incorporação do conceito da Autonomia à prática médica, direito humano mencionado por vários filósofos como John Locke, Baruch Espinosa e Imannuel Kant. Em suma é reconhecido que toda pessoa tem o direito inalienável de fazer suas escolhas pessoais em relação à sua vida, suas crenças e seu relacionamento social.

Apesar dessas transformações, a relação médico-paciente continua baseada na confiança, havendo um contrato informal tácito, onde o médico se obriga a utilizar todos os meios ao seu alcance para cumprir sua missão de assistir ao paciente, e este, de colaborar ativamente para o sucesso da atenção médica, conforme seus próprios valores. 

Feitas essa observações, entendemos tanto o médico quanto o paciente têm seus valores e suas autonomias, que devem ser respeitados. 

Ao médico cabe o dever de utilizar todos os meios referentes à perícia, prudência e técnica para chegar aos seus objetivos. Ao paciente, colaborar, no sentido de preservar sua própria saúde. 

Mas fica a pergunta: com base na respectiva autonomia, o paciente tem o direito de abandonar ao tratamento e/ou de não seguir as recomendações no pós-operatório? Sim, claro que tem. Mas tal decisão deve ser escrita no prontuário, com todos os detalhes. 

Ao manter um relacionamento respeitoso e educado com atendidos e seus familiares, e ao cumprir todos os deveres acima elencados o médico dificilmente será vitima de qualquer manobra aética por parte de seu paciente. 

(Parecer Consulta nº 155.608/11, do Cremesp http://migre.me/ka0wt )
(Centro de Estudos Bioéticos do Cremesp)

Genival Veloso de França



Falar em medicina legal no Brasil torna-se quase que obrigatório citá-lo em algum momento. Autor de uma das obras mais conhecidas entre estudantes dos cursos de direito e medicina, o legista paraibano Genival Veloso de França com seus livros "Medicina legal" e "Direito médico" é a grande referência médico-legal brasileira.

Nascido em 1933, o médico, advogado e professor titular da Universidade Federal da Paraíba, hoje com 81 anos, é acatado e aplaudido tanto em centros acadêmicos do nosso país e fora dele.

Da infância pobre na periferia de João Pessoa, junto com outros 6 irmãos, conseguiu transpor as dificuldades que sua condição social lhe impusera. Estudou sempre em escola pública e teve que conciliar o ensino médio à noite e o trabalho durante o dia, tendo por 2 vezes ter que interromper os estudos, o que não lhe impediu de lutar pela concretização de seus sonhos, tendo em 1954 sua entrada na 1ª turma de medicina da Universidade Federal da Paraíba.

Mesmo sem grande escolaridade, seus pais sempre o incentivaram a avançar em seus estudos. O grande desejo de seu pai era que fosse advogado e sua mãe, médico. Hoje é um grande teórico de uma ciência que une estas duas áreas.

“Aprendi a ser humilde. Muita modéstia e pouca presunção. O acesso à fama deve ser um caminho limpo, lento e inocente. Duvidai de vós mesmos. Crer é fácil, difícil é descrer, porque exige recurso, imaginação e autoridade. Há os que acreditam em tudo porque não sabem ou porque não podem descrer”.

(FRANÇA, Genival Veloso de)

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Racismo e Injúria racial



A injúria racial está tipificada no artigo 140, § 3º, do Código Penal Brasileiro, e consiste em ofender a honra de alguém com a utilização de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem. Recentemente, a ação penal aplicável a esse crime tornou-se pública condicionada à representação do ofendido, sendo o Ministério Público o detentor de sua titularidade.

Nas palavras de Celso Delmanto, "comete o crime do artigo 140, § 3º, do CP, e não o delito do artigo 20 da Lei n. 7.716/1989, o agente que utiliza palavras depreciativas referentes a raça, cor, religião ou origem, com o intuito de ofender a honra subjetiva da vítima" (Celso Delmanto e outros. Código Penal comentado, p. 305).

Já o crime de racismo, previsto na Lei n. 7.716/1989, implica conduta discriminatória dirigida a determinado grupo ou coletividade. Considerado mais grave pelo legislador, o crime de racismo é imprescritível e inafiançável, que se procede mediante ação penal pública incondicionada, cabendo também ao Ministério Público a legitimidade para processar o ofensor.
Fonte: site do MPDFT

Saiba mais assistindo ao vídeo:  http://goo.gl/UsPPyW

Beccaria: o crime e a pena



A Teoria Clássica da Criminologia nasce no séc. XVIII, em pleno Iluminismo, em que se busca quebrar as barreiras do período absolutista, tendo-se como ideal: a liberdade, a igualdade e a fraternidade. 

Nesta época, teóricos iluministas como Grocius, Locke, Rousseau e Hobbes tentam decifrar as origens do nascimento da sociedade e do Estado, tendo como uma das idéias “o contrato social”. Nele, o indivíduo abre mão de parte de sua liberdade individual para viver em sociedade, formando um corpo social, em troca de segurança e proteção de sua propriedade.

Dentro deste contexto a teoria clássica da criminologia nasce, tendo em Cesar Beccaria (com sua obra "Dei Delitti e delle Pene") o seu maior mentor. Para ele, o criminoso é um indivíduo normal, que tem o seu livre arbítrio para conviver em sociedade, mas, ao praticar o delito, quebra o contrato social, que o autorizaria ao convívio em sociedade, devendo, portanto, tal indivíduo, ser expurgado do meio em que vive.

O criminoso era um pecador que optou pelo mal, embora pudesse e devesse respeitar a lei. O delito era visto, portanto, como a quebra do pacto social. E a punição deveria ser proporcional ao mal causado (“a pena é a negação da negação do direito” - Hegel).

A pena seria o meio de se evitar o caos social, servindo de exemplo à sociedade, de forma que outros não buscassem este caminho.

Beccaria apresenta em seu livro "Do Delito e das Penas" algumas idéias básicas sobre o contexto do crime, das leis penais, da punição, entre outros apontamentos, sendo tais idéias o berço da Criminologia.

a) A pena deve ter caráter retributivo;

b) As penas devem ser criadas pelo poder legislativo, o qual não deve julgar;

c) O juiz enquanto representante do poder judiciário deve se ater à letra da lei, não lhe cabendo interpretação ampla – o criminoso (ou acusado) deve conhecer exatamente os limites do crime e da pena que praticou (ou do qual que está sendo acusado);

d) Deve existir proporcionalidade entre a pena aplicada e o crime cometido;

e) A tortura não é método eficaz para se obter a confissão, pois aquele que for mais fraco sempre tenderá a se tornar o culpado, e o mais forte, ainda que culpado, por suportar mais a tortura, pode sair sem ser punido;

f) A pena de morte não é meio eficaz de punição, pois, além de ser quase uma redenção ao criminoso, é valor não acatado pelo senso geral da sociedade. A prisão perpétua acaba sendo mais eficaz, servindo o criminoso, por longa data, de exemplo para a sociedade;

g) Deve existir igualdade civil entre as penas aplicadas aos indivíduos, ou seja, a elite e o miserável devem receber a mesma punição para o mesmo delito praticado.

Beccaria, através de sua obra, faz uma crítica ao sistema penal vigente a época, chamando-o de uma aberração teórica, denunciando abusos dos juízes, a prática de torturas, os julgamentos secretos e a desproporcionalidade das penas, contribuindo assim, para uma posterior reforma desse sistema. 

Ele deixa um legado notável à compreensão, não só de questões penais referentes à época, mas de atualidade indiscutível.

(Dulcineia Moreira dos Santos, Valquíria Avelar, Alter Piana Filho, Carla Auxiliadora Duarte Figueiredo, Peterson Guariento, Erivelton de Castro Abreu e Raquel Luane de Souza da Escola Superior Dom Helder Câmara para a revista DomTotal)

(Tânia Braga de Paula, Centro Universitário do Norte Paulista)
(Maria da Glória Colucci, Mestre em Direito Público pela UFPR e membro da Saciedade Brasileira de Bioética)

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Tragédias escolares - O massacre de Columbine

O fenômeno School Shooting



Massacres em escolas vem sendo bastante discutidos nos últimos anos, infelizmente, é algo que ainda vemos nos noticiários. Do famoso e assustador caso de Columbine em 1999 ao mais recente caso de Realengo, cidade do Rio de Janeiro, onde um rapaz de 23 anos, vítima de bullying na infância, mata 12 alunos antes de se matar. 

Trata-se do fenômeno conhecido, em termos gerais, como School Shooting (em uma tradução aproximada: tiroteios na escola). Os school shooters (os atiradores) algumas vezes deixam claro que seu alvo é a escola (instituição) e o que ela representa, bem como a própria sociedade da qual se consideram vítimas.

Um dos mais violentos e mais conhecidos ataques desse tipo aconteceu em 20 de abril de 1999, na Columbine High School, em Littleton. Eric Harris, de 18 anos, e Dylan Klebold, de 17, dois estudantes da escola, mataram 12 colegas e um professor, deixaram outras 23 pessoas feridas e cometeram suicídio, totalizando 15 mortos. A história inspirou a realização do filme "Tiros em Columbine" de Michael Moore, que ganhou o Oscar de melhor documentário em 2003.

Mas afinal o que motivou esses dois jovens a cometerem tamanha chacina?

Columbine, o primeiro massacre em uma escola americana transmitido, em grande parte, ao vivo pela TV, levou a extensas pesquisas sobre o perfil de atiradores como Harris e Klebold. Em 2002, o Serviço Secreto dos Estados Unidos e o Departamento de Educação americano apresentaram seus primeiros resultados: os atiradores em escolas não tinham um perfil definido, mas na maioria dos casos eram depressivos e se sentiam perseguidos.

A socióloga de Princeton, Katherine Newman, co-autora do livro Rampage: The Social Roots of School Shootings, disse que jovens como Harris e Klebold não eram solitários - eles apenas não eram aceitos pelos garotos que importavam. "Obter atenção ao se tornar notório é melhor do que ser um fracasso", disse.

A motivação para o ataque seria vingança pela exclusão social que os dois teriam sofrido. 

O ataque suscitou sérias discussões sobre o controle de armamentos, maus-tratos a adolescentes nas escolas e segurança nas instituições de ensino norte-americanas, e se tornou referência em relação a violência nas escolas.

Ambiente familiar e desenvolvimento psicossocial

Problemas comportamentais apresentados na infância podem persistir na adolescência e na vida adulta, e os pais têm grande participação nesse processo. O psicólogo Urie Bronfenbrenner propôs a teoria em que o desenvolvimento humano considera os relacionamentos dentro dos sistemas ambientais dos quais a criança participa. De acordo com essa teoria a família é o primeiro ambiente da criança e dentro desse microssistema, as primeiras interações sociais ocorrem em forma de díades (mãe-filho, pai-filho, etc.). Com o passar do tempo essas relações vão se expandindo, permitindo à criança novas interações. O microssistema familiar é a maior fonte de afeto, segurança, proteção e bem-estar, proporcionando o importante senso de permanência e estabilidade nos primeiros anos de vida. O senso de permanência diz respeito à segurança de que os elementos centrais da experiência de vida são estáveis e organizados dentro das rotinas diárias familiares. A estabilidade se define pela segurança das relações entre pais e filhos, e pela expectativa de que mesmo em situações de estresse não haverá ruptura nos relacionamentos. Assim, a ausência de interações saudáveis entre pais e filhos poderia afetar o desenvolvimento das crianças e sua preparação para a vida social dos anos posteriores.

A influência da mídia

Estudos sobre os efeitos dos modelos apresentados pela mídia no comportamento de crianças têm mostrado que este é um fator significativo. Crianças e adolescentes podem tornar-se menos sensíveis à dor alheia ou podem sentir-se amedrontados após a exposição a programas violentos na televisão. Um relatório da da American Psychological Association cita que programas infantis freqüentemente apresentam até vinte cenas contendo agressões, a cada hora.

Não se pode esquecer, ainda, que hoje são comercializados jogos nos quais é possível escolher desempenhar o papel do bandido ou do mocinho, como é o caso do jogo Counter-Strike, ou jogos em que o jogador recebe pontos por infringir algumas regras sociais importantes tais como regras de trânsito (incluindo pontuação para o jogador por atropelar pedestres) como é o caso do jogo Carmageddon.

Ambientes sociais inadequados e o desenvolvimento de psicopatologias

Apesar dos dados que sugerem fortes influências do meio-ambiente familiar e da mídia na formação inadequada dos jovens atiradores, é importante evitar explicações deterministas. Cada um dos fatores identificados deve ser compreendido como parte de uma complexa rede de variáveis, boa parte delas de origem social.

Há um perfil característico dos estudantes atiradores (nem psicológico nem demográfico): a dificuldade dos atiradores em lidar com perdas significativas e falhas pessoais, interesse por mídia violenta (filmes, jogos, livros e outros), o fato de terem sido ou estarem sendo vítimas de perseguições e humilhações de colegas, a manifestação de comportamentos anteriores que sinalizavam que eles precisavam de ajuda, dentre outros.

(Timoteo Madaleno Vieira, revista Psicologia: reflexão e crítica - Artigo na íntegra: http://migre.me/k4AnI)
(Portal G1)
(Portal Terra)

Lei Maria da Penha contra o filho

STJ admite aplicação preventiva da Lei Maria da Penha em ação cível.

Saiba mais sobre o caso: http://bit.ly/1ntAgoG #LeiMariadaPenha


terça-feira, 15 de julho de 2014

A necropsia de Napoleão Bonaparte

Sal na comida pode ter sido o veneno



Esqueça a história de envenenamento. Tudo leva a crer que Napoleão Bonaparte, o imperador que governou a França com mão de ferro em dois períodos, entre 1804 e 1815, padeceu da mesma doença que no ano passado matou 650 mil pessoas no mundo: câncer de estômago.

Para muitos historiadores, a hipótese de assassinato sempre fez sentido. Afinal, os adversários políticos de Napoleão temiam que ele desse um jeito de escapar da prisão, na ilha de Santa Helena, e retomasse o poder - do qual abdicara após a derrota para ingleses e prussianos na Batalha de Waterloo. Na verdade, é bem capaz que o próprio imperador preferisse uma morte assim, cinematográfica. Ela combinaria bem mais com seu ego - que, segundo dizem, foi ainda maior que a ambição de conquistar a Europa. Durante décadas, apostou-se na possibilidade de Napoleão ter sido envenenado com arsênico, substância encontrada em seus fios de cabelo (preservados e analisados anos após sua morte, em 1821). O veneno teria sido gradualmente adicionado a tudo que o preso comia e bebia, sem que ele percebesse.

O enredo é ótimo, mas parece não ter fundamento. Hoje, acredita-se que a origem do arsênico encontrado em seus cabelos era outra: na época de Napoleão, pequenas quantidades dessa substância costumavam ser usadas na fabricação de vários produtos, como tônicos capilares, remédios e até papel de parede.

Autópsias rigorosas

Segundo Robert Genta, professor de patologia da Southwestern Medical School, nos EUA, o que realmente matou Napoleão foi mesmo um "trivial" câncer de estômago. Genta estudou inúmeros documentos sobre a morte do imperador, principalmente as anotações do cirurgião François Antommarchi, responsável por duas rigorosas autópsias. Os manuscritos falam de lesões nas paredes do estômago e da presença, em todo o órgão, de um material "que lembrava grãos de café". Para o patologista, são evidências de sangramento decorrente do câncer.

Genta comparou as descrições feitas por Antommarchi com 135 casos atuais de pacientes com câncer de estômago, e concluiu que o mal de Napoleão Bonaparte só poderia ser esse. "É muito difícil [para não dizer impossível] precisar a causa da doença", diz o professor. "Ela pode ter sido provocada, entre outros fatores, até por uma predisposição familiar. Mas os soldados da época, inclusive o imperador, comiam muitos alimentos preservados em sal, riquíssimos em nitritos. E é sabido que esse tipo de comida aumenta o risco de câncer gástrico."

(Ivonete Lucirio, para Superinteressante)

Declaração de Óbito



A Declaração de Óbito é um documento público, padronizado, impresso pelo Ministério da Saúde e de distribuição gratuita.

Cada formulário possui 3 vias. No Rio Grande do Sul, tanto a 1ª via (branca) para fins estatísticos quanto a 2ª via (amarela) devem ser entregues aos familiares para possibilitar o registro em cartório e o sepultamento (a Secretaria Municipal de Saúde retira a 1ª via depois no cartório), a 3ª via (rosa) deve ser retida e armazenada pelo estabelecimento de saúde, pelo serviço de verificação de óbitos ou pelo IML.

A Declaração de Óbito deve ser preenchida para todos os óbitos, inclusive os fetais, independente do local de ocorrência (estabelecimentos de saúde, domicílios ou outros locais).

O óbito é considerado fetal quando a duração da gestação é igual ou superior a 20 semanas, ou peso do feto é igual ou superior a 25 cm. Em qualquer dos casos deve haver emissão de DO.

A descrição das causas de morte

A Causa Básica é definida como "a doença ou lesão que iniciou a cadeia de acontecimentos patológicos que conduziram diretamente à morte, ou as circunstâncias do acidente ou violência que produziram a lesão fatal) (OMS, 1996).

A frase "devido ou em consequência de" impressa abaixo de todas as linhas existe, exatamente, para relacionar o evento da linha anterior ao da subsequente.

Exemplo 1: Falecimento de homem com traumatismo crânio-encefálico como consequência de acidente de trânsito. A causa básica será acidente de trânsito.
Linha a: Traumatismo crânio-encefálico
devido ou em consequência de
Linha b: Acidente de trânsito

Exemplo 2: Paciente tinha febre tifóide e apresentou perfuração intestinal, falecendo em consequência de peritonite. Neste caso, a causa básica é a febre tifóide, e as consequências ou complicações são a perfuração intestinal e a peritonite (sendo esta a causa terminal).
Linha a: Peritonite
devido ou em consequência de
Linha b: Perfuração intestinal
devido ou em consequência de
Linha c: febre tifóide

História da DO

Até o final do século XiX, casa país possuía um modelo diferente de atestado de óbito, fato que fez com que a Organização de Saúde da Liga das Nações criasse um modelo internacional, que a partir de 1950 passou a ser utilizado por todos os países. O Brasil, em 1976, adotou uma Declaração de Óbito padronizada em todo o território nacional tendo por base o modelo internacional de atestado de óbito.

Declaração de Óbito X Certidão de Óbito

Não confunda! São documentos diferentes!

A certidão de óbito é um documento público emitido por um Cartório de Registro Civil, cujo conteúdo é extraído daquilo que foi registrado no livro de assentamento (que fica sempre no cartório).

Uma certidão de óbito pode ser emitida no Brasil em dois formatos: em breve relato, que traz os dados principais inscritos no livro de assentamento ou em inteiro teor, que reproduz tudo o que foi escrito no livro.

A Declaração de Óbito, como vimos, também chamada popularmente de atestado de óbito, é o documento médico que declara o término da vida de um indivíduo, apontando também as causas que ocasionaram a morte.

(Resolução Nº 160/09 - CIB/RS, Secretaria de Saúde do Estado do rio Grande do Sul)
(Manual de instruções para o preenchimento de declarações de Óbito do Ministério da Saúde)

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Cesare Lombroso e a fisionomia do criminoso



Criminologia

O italiano Cesare Lombroso (1835-1909) foi médico, psiquiatra, antropólogo e político e é considerado um dos pais da criminologia, com seu livro "O homem delinquente" de 1876. Ele desenvolveu uma teoria bastante peculiar sobre o criminoso: que ele teria certas características físicas próprias. 

Olha só como seria um criminoso para Lombroso:

Para começar, os criminosos seriam mais altos que a média (e isso significava 1,69m na Veneza e 1,70 na Inglaterra), teriam crânios menores que os dos homens “normais” e maiores do que os crânios dos “loucos”, além de uma aparência desagradável, mas não deformada, sendo que estupradores e sodomitas teriam feições feminilizadas.

Outras características comuns seriam orelhas de abano, nariz adunco, queixo protuberante, maxilar largo, maçãs do rosto proeminentes, barba rala, cabelos revoltos, caninos bem desenvolvidos, cabelos e olhos escuros. Ladrões teriam olhar esquivo, já os assassinos um olhar firme e vidrado. Seriam ainda especialmente insensíveis à dor.

Teriam preferência por tatuagens o que provaria sua insensibilidade à dor. Os locais preferidos para tatuagens em geral (não necessariamente entre criminosos) seriam os ombros, o peito (marinheiros) a parte interna do braço e os dedos (mineiros). Criminosos teriam tatuagens nas costas ou nos genitais, muitas vezes denotando uma gangue ou imagens obscenas. Criminosos seriam ainda infantis, empáticos e extremamente vaidosos (a ponto de facilitar o trabalho de seus perseguidores) e um senso de moral extremamente apurado. Suas paixões exacerbadas que levariam a reações desproporcionais e criminosas às ações mais triviais. Isso sem contar seu interesse antinatural pelo mórbido.

Entre as mulheres, o que denotaria o potencial criminoso seria uma certa masculinidade nos traços e na voz, causados por um excesso de pelos corporais, verrugas, cordas vocais grossas com relação à laringe, mamilos pequenos ou muito grandes e mesmo sua forma de escrever. As mulheres criminosas seriam em geral mais cruéis que os homens, e possuiriam vitalidade, reflexos e força incomuns.

Hoje em dia, a maior parte de suas conclusões soam preconceituosas e tendenciosas, mas em sua época, Lombroso foi bastante respeitado e influente (inclusive no Brasil), sendo um retrato dos preconceitos sociais da Europa no século XIX, algo muito característico de seu tempo. 

Para refletir:

O autor determinou seis tipos de criminosos: o nato, o louco moral, o epiléptico, o louco, o ocasional e o passional. No entanto, as características encontradas por Lombroso eram basicamente do negro, imigrante na Itália. A tal “face” criada pelo autor se confundia com a figura afro, fato que tachou sua tese como racista.

Cesare foi um pioneiro, um estudioso renomado, mas apesar de sua teoria ter caído em desuso, tachar alguém de “marginal” é algo presente em nossa sociedade até os dias atuais. Ao contrário do autor que usava o formato do crânio, mandíbula, ente outros para formar sua opinião, hoje as características são outras. O local de sua moradia, suas vestimentas, a forma de andar..., os aspectos físicos determinados por Lombroso foram substituídos por aspectos sociais.

(Yuri Carvalho Nazareth e Carolina Carneiro Rodrigues, para revista DomTotal)
(Renato M.E. Sabbatini, PhD, para Portal Cérebro e Mente)
(Blog Construindo Victória)

Falsificar atestado médico é crime!

Fique atento ao Código Penal: http://bit.ly/1dqm1Rx.


domingo, 13 de julho de 2014

Psicopatia infantil



“Não é fácil a sociedade aceitar a maldade infantil, mas ela existe; essas crianças não têm empatia, isto é, não se importam com os sentimentos dos outros e não apresentam sofrimento psíquico pelo que fazem. Manipulam, mentem e podem até matar sem culpa.”

A fala acima, do psiquiatra Fábio Barbirato, chefe da Psiquiatria Infantil da Santa Casa no Rio de Janeiro, pode parecer assustadora, e realmente é. Ela toca em um assunto delicadíssimo: a psicopatia infantil. A maioria das pessoas não sabem, mas existem sim crianças psicopatas. Elas não respeitam os pais, chantageiam, roubam, mentem, manipulam, maltratam irmãos e amiguinhos, torturam animais, e até, matam.

Segundo uma pesquisa da Asso­cia­ção Brasileira de Psiquiatria (ABP), cerca de 3,4% das crianças apresentam problemas de conduta como mentir, brigar, furtar e desrespeitar. A crueldade com animais é outra das características em crianças e adolescentes a que os médicos mais chamam a atenção para diagnosticar o transtorno de conduta. Se for recorrente e estiver aliado a mentiras frequentes, furtos e agressões, por exemplo, esse comportamento pode ser bem preocupante.

Uma criança não pode ser considerada psicopata com base no critério do DSM-IV, e só o diagnóstico de Transtorno da Personalidade Anti-Social pode lhes ser aplicado. Neste período, de acordo com certos comportamentos antissociais, a criança pode ser diagnosticada com Transtorno de Conduta. 

Como o diagnóstico de psicopatia é um tanto complexo, aqueles que convivem com uma criança que apresentam certas características devem procurar um auxílio psicológico para trabalhar com o transtorno. Algumas destas características são: mentiras frequentes, crueldade com colegas e irmãos, baixíssima tolerância à frustração, ausência de culpa ou remorso e falta de constrangimento quando pegos mentindo ou em flagrante. Os pais devem ficar em alerta caso essas características comportamentais ocorram de maneira repetitiva e persistente em crianças e adolescentes. É possível que os filhos apresentem transtorno de conduta e sejam candidatos à psicopatia quando se tornarem adultos.

Cabeça de criança é diferente da de um adulto - e precisa ser tratada como tal. Antes dos 7 anos ela ainda não tem a capacidade de julgamento totalmente formada, ou seja, a consciência do que pode ou não pode fazer. Simplesmente vai lá e faz. Pais, familiares e educadores vão dando os limites e assim ela os aprende - ou não. "Quando um garoto de 6 anos coloca o gato no micro-ondas, ele não sabe o que faz. Já, se isso acontecer com um garoto de 8 anos, será mais preocupante", diz Francisco Assumpção Júnior, psiquiatra infantil, professor da Faculdade de Medicina e do Instituto de Psicologia da USP.

(Mariana Sgarioni, para Superinteressante)
(Blog O aprendiz verde)
(Blog Comportamento criminoso)

Dano moral, assédio moral e assédio sexual



Saiu no Jornal Folha de São Paulo no dia 15/3/12:

“Justiça condena Banco do Brasil por assédio moral
O Banco do Brasil foi condenado pela Justiça do Trabalho a pagar R$ 600 mil de indenização por danos morais coletivos.
Para o Tribunal Regional do Trabalho de Brasília, a prática de assédio moral na instituição evidencia 'verdadeira ferramenta de gestão nas unidades do banco'.
Maior banco da América Latina em volume de ativos (patrimônio), o BB tem 114 mil funcionários.
A ação enumera uma série de práticas de assédio moral: isolamento no ambiente de trabalho de um portador do vírus HIV, interrupção de licença-maternidade, retaliações a grevistas (…)
A indenização, se e quando paga, será revertida ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador)”

A CLT exige para configurar uma relação de emprego, entre outros elementos, que o empregado esteja subordinado à empresa. Quando a CLT diz subordinação, ela se refere aos poderes de comando e direção do empregado, ou seja, que a empresa pode dar ordens ao empregado para que cumpra a função para qual foi contratado em troca de salário.

Se a pessoa não está subordinada à empresa, ela não é empregada (é o caso de representante comercial autônomo que não é obrigado a seguir cumprir horário de entrada e saída).

É aí que surge o ‘poder diretivo’ do chefe, que é o representante da empresa para dar ordens ao empregado. Ou seja, ele é a pessoa que deve exercer o direito de a empresa manter o empregado sob sua subordinação.

No exercício da subordinação, o chefe deve seguir parâmetros e limites que não atinjam a dignidade do trabalhador ou extrapolem o poder diretivo da empresa. Esse poder deve ser exercido com respeito, não expondo o empregado a situações vexatórias ou constrangedoras, como atribuir serviços além da capacidade do empregado ou gritar ao dar ordens.

O dano moral surge quando há a extrapolação do poder de subordinação. É o chefe que manda o empregado subir e dançar na mesa porque não atingiu a meta do mês, ou, insatisfeito com o desempenho do empregado, o ofende na frente dos demais colegas. Essas situações isoladas caracterizam o dano moral.

Entretanto, algumas situações se tornam permanentes, muitas vezes para fazer com que o empregado peça demissão (e a empresa economize nas verbas demissionais). E, nesse caso, surge o assédio moral. Ele pode ser na forma de estabelecer constantemente metas impossíveis ou, o oposto, não estabelecer meta nenhuma, deixando o empregado na ‘geladeira’. Isso é o que se chama de assédio vertical.

O assédio também pode ser ‘horizontal’, quando ele não parte da chefia, mas dos colegas de trabalho. É o caso de colegas que atribuem apelidos desrespeitosos, incomodando o colega, ou fazem brincadeiras de mau gosto constantes. Aqui, embora o assédio não tenha partido da empresa, ele aconteceu por causa da relação de trabalho e no ambiente de trabalho. Por isso é importante que o empregado comunique à chefia, caso não seja evidente (muitas vezes, o próprio chefe é omisso – o que acaba por incentivar ainda mais o assédio). Como todos estão subordinados à mesma empresa, e a empresa é responsável pelo local de trabalho, ela deve tomar providências a respeito ou pode ser responsabilizada. 

Na esfera criminal, há também o assédio sexual, que é alguém utilizar-se de sua posição hierárquica (normalmente o chefe, mas não necessariamente ele) para constranger alguém com a finalidade de obter uma vantagem ou favorecimento sexual.

(Coluna Para entender direito, Folha de S. Paulo)